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Governo Chávez ensaia ajuste macroeconômico

Embora todo o governo tenha se esforçado em negá-lo, há algum tempo que, economicamente falando, o ano de 2009 anunciava ser um ano difícil para a Venezuela. Por quê? A drástica queda dos preços do petróleo, que em menos de seis meses caíram de 120 dólares por barril, em julho passado, para menos de 40 dólares atualmente. As vendas de óleo cru representam 94% das divisas que o país recebe.

"Mesmo que o valor do petróleo seja zero, a Venezuela não entrará em crise, a revolução não será detida", afirmou em várias ocasiões o presidente Hugo Chávez, que, no entanto, deu ordem aos seus ministros para que tomem as medidas necessárias para incrementar as exportações não tradicionais.

Contudo, esta última instrução vem se mostrando cada dia mais difícil de se fazer cumprir. Desde o dia 15 de fevereiro passado, quando conseguiu que 54% dos venezuelanos aprovassem a emenda constitucional que lhe permite candidatar-se quantas vezes queira, o mandatário endureceu o discurso contra o setor privado e tomou medidas justamente contra aqueles que poderiam oferecer os dólares necessários para manter a economia em alta no país.

Intervenções em processadoras de alimentos, "recuperação" de propriedades rurais e a expropriação de uma processadora de arroz de propriedade da empresa multinacional Cargill, são algumas das ordens dadas por Chávez nas últimas semanas.

Para o analista Abelardo Daza, este tipo de ações busca "transmitir a sensação de que a distribuição dos custos do ajuste será eqüitativa. Nos próximos meses virão decisões duras e impopulares e isso tenta colocar na opinião pública a mensagem de que as empresas e as pessoas de renda média e alta serão afetadas pela crise".

Em declarações ao Terra Magazine, o especialista afirmou que as ameaças contra empresas como a Polar, o principal conglomerado de alimentos e bebidas do país, têm como objetivo conseguir que o controle de preços vigente até 2003 seja mais respeitado.

"Se na Venezuela houvesse correção monetária ou a inflação continuasse subindo, é possível dizer que os estímulos para cumprir o controle seriam menores. Estas ações tentam fazer com que o setor privado produza os alimentos regulados, mesmo com perdas financeiras, para não correr o risco de ser expropriados", afirmou.

Descartam expropriações em massa

Embora a aquisição forçada da processadora de arroz da Cargill tenha sido classificada de "negativa", Daza descartou que as ameaças de expropriações lançadas contra outras indústrias sejam materializadas, pois "a experiência de produção de alimentos por parte do governo foi negativa".

O economista lembrou que em 2007, a então Ministra da Alimentação, Érika Farias, tentou reduzir o volume de importação de alimentos e substituí-lo por produtos nacionais, e não apenas fracassou como também provocou um desabastecimento de alimentos que há 20 anos não se via. "Penso que o governo compreende que a produção de alimentos é um tema delicado e que pode ter um preço político muito elevado", disse.

Por outro lado, o professor do Instituto de Estudos Superiores em Administração (IESA), Miguel Ángel Santos, disse que as medidas contra as empresas são um "sinal" do presidente "ao seu povo mostrando que não está indiferente" à crise.

Anunciam um ajuste

Tanto Daza quanto Santos afirmaram que o governo do presidente Chávez, cedo ou tarde, terá de aplicar um plano de ajuste para suportar a queda dos ingressos com petróleo, a qual abriu um rombo de 50% nas contas fiscais, pois o orçamento foi calculado com base em um barril de 60 dólares.

Em um artigo publicado recentemente, o professor respondeu àqueles que, desde o Executivo, sustentam que a situação financeira mundial não terá repercussões no país. "É muito útil olhar a nossa recente experiência com as quedas do petróleo para poder determinar como isso nos afetará. Durante o ano de 2001 (em que o petróleo caiu de 26 para 20 dólares) e 1999 (de 16 para 10), a nossa produção diminuiu entre 6% a 9%, a nossa taxa de inflação foi duplicada, e a renda familiar caiu entre 12% e 15%. Mas também há (Jaime) Lusinchi (1984-1989), a nova referência obrigatória da revolução. Em 1986, com o petróleo caindo de 30 para 13 dólares por barril, Lusinchi decidiu utilizar uma combinação de reservas e endividamento para manter circulando o whisky e os doces até o final do seu período. E aí está o detalhe: como diria Cantinflas: "O seu (mandato) tinha data de vencimento". Essa não é uma possibilidade para Chávez (graças a sua emenda). Visto dessa forma, convém ao governo utilizar as reservas para tentar evitar um ajuste maior, mas não pode correr o risco de ficar sem gasolina a quatro anos de 2012 (data das eleições presidenciais)", escreveu.

Segundo o Banco Central da Venezuela, as reservas consistem em 29,3 bilhões de dólares e mais outros ativos no exterior que somam entre 13 e 25 bilhões, as autoridades têm entre 8 e 11 meses de importações garantidos.

Para Santos, o retorno de Jorge Giordiani ao Gabinete, que justamente foi o responsável por contornar as conjunturas de 1999 e 2001, é uma evidência inequívoca do que está por vir.

Por sua vez, Daza prevê que o Governo novamente recorrerá ao incremento da dívida pública interna, a qual "possivelmente crescerá para 3 ou 4 mil bilhões de dólares" para cobrir o déficit. Também deu como certo que a redução dos gastos se dará em áreas sensíveis, como o investimento em infra-estrutura, embora as autoridades o neguem. Na sexta-feira, operários que trabalham na construção da linha 5 do Metrô de Caracas, revelaram à imprensa que as obras serão paralisadas por falta de recursos e que aproximadamente 2.800 trabalhadores ficariam sem emprego.

O especialista considera possível o surgimento de impostos seletivos como os aplicados às transações bancárias, e conclui: "O governo vai ficar à mercê do que acontecer na economia mundial e com o preço do petróleo. Se a economia se recupera e os preços do óleo sobem, a aposta do governo terá sido boa, do contrário, teremos o ajuste de janeiro de 2010 do qual todo mundo fala".

Fonte: Terra Magazine

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