As Duas Ilhas
Sobre uma página de poesia de V. Hugo com o mesmo título
Quando à noite -- às horas mortas --
O silêncio e a solidão
-- Sob o dossel do infinito --
Dormem do mar n'amplidão,
Vê-se, por cima dos mares,
Rasgando o teto dos ares
Dois gigantescos perfis...
Olhando por sobre as vagas,
Atentos, longínquas plagas
Ao clarear dos fuzis.
Quem os vê, olha espantado
E a sós murmura: "O que é?
Ai! que atalaias gigantes,
São essas além de pé?!. . ."
Adamastor de granito
Co'a testa roça o infinito
E a barba molha no mar;
E de pedra a cabeleira
Sacudind'a onda ligeira
Faz de medo recuar...
São -- dons marcos miliários,
Que Deus nas ondas plantou.
Dons rochedos, onde o mundo
Dous Prometeus amarrou!...
-- Acolá. . . (Não tenhas medo!. . . )
E Santa Helena -- o rochedo
Desse Titã, que foi rei! . . .
-- Ali. .. (Não feches os olhos!. . . )
Ali... aqueles abrolhos
São a ilha de Jersey!...
São eles -- os dous gigantes
No século de pigmeus.
São eles -- que a majestade
Arrancam da mão de Deus.
-- Este concentra na fronte
Mais astros -- que o horizonte,
Mais luz -- do que o sol lançou! . . .
-- Aquele -- na destra alçada
Traz segura sua espada
-- Cometa, que ao céu roubou!...
E olham os velhos rochedos
O Sena, que dorme além...
E a França, que entre a caligem
Dorme em sudário também...
E o mar pergunta espantado:
"Foi deveras desterrado
Buonaparte -- meu irmão?..."
Diz o céu astros chorando:
"E Hugo?. . . " E o mundo pasmando
Diz: "Hugo. . . Napoleão! . . . "
Como vasta reticência
Se estende o silêncio após...
Es muito pequena, ó França,
P'ra conter estes heróis...
Sim! que estes vultos augustos
Para o leito de Procustos
Muito grandes Deus traçou...
Basta os reis tremam de medo
Se a sombra de algum rochedo
Sobre eles se projetou!...
Dizem que, quando, alta noite,
Dorme a terra -- e vela Deus,
As duas ilhas conversam
Sem temor perante os céus.
-- Jersey curva sobre os mares
À Santa Helena os pensares
Segreda do velho Hugo...
-- E Santa Helena no entanto
No Salgueiro enxuga o pranto
E conta o que Ele falou...
E olhando o presente infame
Clamam: "Da turba vulgar
Nós -- infinitos de pedra --
Nós havemo-los vingar! .."
E do mar sobre as escumas,
E do céu por sobre as brumas,
Um ao outro dando a mão...
Encaram a imensidade
Bradando: "A Posteridade!..."
Deus ri-se e diz: "Inda não!..."
Ao Ator Joaquim Augusto
Um dia Pigmalião -- o estatuário
Da oficina no tosco santuário
Pôs-se a pedra a talhar...
Surgem contornos lânguidos, amenos...
E dos flocos de mármore outra Vênus
Surge dest'outro mar.
De orgulho o mestre ri... A estátua é bela!
Da Grécia as filhas por inveja dela
Vão nas grutas gemer...
Mas o artista soluça: "O Grande Jove!
"Ela é bela . . . bem sei -- mas não se move!
"E sombra -- e não mulher!"
Então do excelso Olimpo o deus-tonante
Manda que desça um raio fulgurante
À tenda do escultor.
Vive a estátua! Nos olhos -- treme o pejo,
Vive a estátua!.. . Na boca -- treme um beijo,
Nos seios -- treme amor.
O poeta é -- o moderno estatuário
Que na vigília cria solitário
Visões de seio nu!
O mármore da Grécia -- é o novo drama!
Mas o raio vital quem lá derrama?...
É Júpiter!... És tu!...
Como Gluck nas selvas aprendia
Ao som do violoncelo a melodia
Da santa inspiração,
Assim bebes atento a voz obscura
Do vento das paixões na selva escura
Chamada -- multidão.
Gargalhadas, suspiros, beijos, gritos,
Cantos de amor, blasfêmias de precitos
Choro ou reza infantil,
Tudo colhes... e voltas cotas mãos cheias,
-- O crânio largo a transbordar de idéias
E de criações mil.
Então começa a luta, a luta enorme,
Desta matéria tosca, áspera, informe,
Que na praça apanhou.
Teu gênio vai forjar novo tesouro...
O cobre escuro vai mudar-se em ouro,
Como Fausto o sonhou!
Glória ao Mestre! Passando por seus dedos
Dói mais a dor... os risos são mais ledos...
O amor é mais do céu...
Rebenta o ouro desta fronte acesa!
O artista corrigiu a natureza! O alquimista venceu!
Então surges, Ator! e do proscênio
Atiras as moedas do teu gênio
As pasmas multidões.
Pródigo enorme! a tua enorme esmola
Cunhada pela efígie tua rola
Nos nossos corações.
Por isso agora, no teu almo dia,
Vieram dando as mãos a Poesia
E o povo, bem o vês;
Como nos tempos dessa Roma antiga
Aos pós desse outro Augusto a plebe amiga
Atirava lauréis...
Augusto! E o nome teu não se desmente...
O diadema real na vasta frente
Cinges... eu bem o sei!
Mandas no povo deste novo Lácio...
E os poetas repetem como Horácio:
"Salve! Augusto! Rei!"
Sobre uma página de poesia de V. Hugo com o mesmo título
Quando à noite -- às horas mortas --
O silêncio e a solidão
-- Sob o dossel do infinito --
Dormem do mar n'amplidão,
Vê-se, por cima dos mares,
Rasgando o teto dos ares
Dois gigantescos perfis...
Olhando por sobre as vagas,
Atentos, longínquas plagas
Ao clarear dos fuzis.
Quem os vê, olha espantado
E a sós murmura: "O que é?
Ai! que atalaias gigantes,
São essas além de pé?!. . ."
Adamastor de granito
Co'a testa roça o infinito
E a barba molha no mar;
E de pedra a cabeleira
Sacudind'a onda ligeira
Faz de medo recuar...
São -- dons marcos miliários,
Que Deus nas ondas plantou.
Dons rochedos, onde o mundo
Dous Prometeus amarrou!...
-- Acolá. . . (Não tenhas medo!. . . )
E Santa Helena -- o rochedo
Desse Titã, que foi rei! . . .
-- Ali. .. (Não feches os olhos!. . . )
Ali... aqueles abrolhos
São a ilha de Jersey!...
São eles -- os dous gigantes
No século de pigmeus.
São eles -- que a majestade
Arrancam da mão de Deus.
-- Este concentra na fronte
Mais astros -- que o horizonte,
Mais luz -- do que o sol lançou! . . .
-- Aquele -- na destra alçada
Traz segura sua espada
-- Cometa, que ao céu roubou!...
E olham os velhos rochedos
O Sena, que dorme além...
E a França, que entre a caligem
Dorme em sudário também...
E o mar pergunta espantado:
"Foi deveras desterrado
Buonaparte -- meu irmão?..."
Diz o céu astros chorando:
"E Hugo?. . . " E o mundo pasmando
Diz: "Hugo. . . Napoleão! . . . "
Como vasta reticência
Se estende o silêncio após...
Es muito pequena, ó França,
P'ra conter estes heróis...
Sim! que estes vultos augustos
Para o leito de Procustos
Muito grandes Deus traçou...
Basta os reis tremam de medo
Se a sombra de algum rochedo
Sobre eles se projetou!...
Dizem que, quando, alta noite,
Dorme a terra -- e vela Deus,
As duas ilhas conversam
Sem temor perante os céus.
-- Jersey curva sobre os mares
À Santa Helena os pensares
Segreda do velho Hugo...
-- E Santa Helena no entanto
No Salgueiro enxuga o pranto
E conta o que Ele falou...
E olhando o presente infame
Clamam: "Da turba vulgar
Nós -- infinitos de pedra --
Nós havemo-los vingar! .."
E do mar sobre as escumas,
E do céu por sobre as brumas,
Um ao outro dando a mão...
Encaram a imensidade
Bradando: "A Posteridade!..."
Deus ri-se e diz: "Inda não!..."
Ao Ator Joaquim Augusto
Um dia Pigmalião -- o estatuário
Da oficina no tosco santuário
Pôs-se a pedra a talhar...
Surgem contornos lânguidos, amenos...
E dos flocos de mármore outra Vênus
Surge dest'outro mar.
De orgulho o mestre ri... A estátua é bela!
Da Grécia as filhas por inveja dela
Vão nas grutas gemer...
Mas o artista soluça: "O Grande Jove!
"Ela é bela . . . bem sei -- mas não se move!
"E sombra -- e não mulher!"
Então do excelso Olimpo o deus-tonante
Manda que desça um raio fulgurante
À tenda do escultor.
Vive a estátua! Nos olhos -- treme o pejo,
Vive a estátua!.. . Na boca -- treme um beijo,
Nos seios -- treme amor.
O poeta é -- o moderno estatuário
Que na vigília cria solitário
Visões de seio nu!
O mármore da Grécia -- é o novo drama!
Mas o raio vital quem lá derrama?...
É Júpiter!... És tu!...
Como Gluck nas selvas aprendia
Ao som do violoncelo a melodia
Da santa inspiração,
Assim bebes atento a voz obscura
Do vento das paixões na selva escura
Chamada -- multidão.
Gargalhadas, suspiros, beijos, gritos,
Cantos de amor, blasfêmias de precitos
Choro ou reza infantil,
Tudo colhes... e voltas cotas mãos cheias,
-- O crânio largo a transbordar de idéias
E de criações mil.
Então começa a luta, a luta enorme,
Desta matéria tosca, áspera, informe,
Que na praça apanhou.
Teu gênio vai forjar novo tesouro...
O cobre escuro vai mudar-se em ouro,
Como Fausto o sonhou!
Glória ao Mestre! Passando por seus dedos
Dói mais a dor... os risos são mais ledos...
O amor é mais do céu...
Rebenta o ouro desta fronte acesa!
O artista corrigiu a natureza! O alquimista venceu!
Então surges, Ator! e do proscênio
Atiras as moedas do teu gênio
As pasmas multidões.
Pródigo enorme! a tua enorme esmola
Cunhada pela efígie tua rola
Nos nossos corações.
Por isso agora, no teu almo dia,
Vieram dando as mãos a Poesia
E o povo, bem o vês;
Como nos tempos dessa Roma antiga
Aos pós desse outro Augusto a plebe amiga
Atirava lauréis...
Augusto! E o nome teu não se desmente...
O diadema real na vasta frente
Cinges... eu bem o sei!
Mandas no povo deste novo Lácio...
E os poetas repetem como Horácio:
"Salve! Augusto! Rei!"
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